sexta-feira, 6 de julho de 2012

E o tratamento se inicia na Sala de Espera...

E o tratamento se inicia na Sala de Espera...

(do livro: "Atualidades em Psicologia da Saúde"-
Ed. Thomson- 2004-SP)
autoria: Silvia Ivancko





Estamos na sala de espera de uma Clínica Oncológica.


Podemos observar rostos sombrios, preocupados, tensos, ansiosos, sérios, com medo e tristes. São estas as expressões dos pacientes que aguardam por uma consulta, um diagnóstico, e muitas vezes a revelação do futuro que o aguarda. No silêncio, olham em direção à televisão como se estivessem interessados em qualquer coisa que ela pudesse trazer, qualquer coisa que tirasse de dentro deles as fantasias tristes que os trazem àquela clínica. Podemos ouvir seus pensamentos:

Será que estou com câncer? Será o fim de tudo?

A cirurgia vai dar certo? Será que vou retirar os pontos? E o dreno? Terei que fazer novos exames? Será que estou curado? E se tiver uma recidiva? Metástase? Por que a quimioterapia? Terei que fazer radioterapia?

Vou me curar? E se não der certo? Que medo!

Segurando firme nas mãos os envelopes de exames quase sempre indecifráveis, algumas vezes acompanhados por pessoas próximas, outras vezes sozinhos por não haver “pessoa próxima” ou por julgar ser esta uma tarefa solitária.

Os minutos são intermináveis...

A cada nome pronunciado há a expectativa de ouvir o seu.

E a espera continua, alimentando os temores cada vez mais.

Não é para menos, carregamos o estigma da palavra (quase sempre impronunciável) da doença que assola o nosso século: o câncer.

O diagnóstico de câncer sempre vem associado à morte, perda de órgãos, perda de cabelos com a quimioterapia, queimaduras na pele na radioterapia, sofrimento, dor, perda de amigos, de companheiros, de trabalho, hospital, cirurgias, perda de peso, até o encontro inevitável da morte indesejável.

É bem verdade que este fato ainda ocorre, com muito menos frequência do que há poucos anos atrás, mas no momento em que se ouve o diagnóstico, estes “fantasmas” nos invadem sem nos pedir licença.

Mas ainda estamos na sala de espera.

Esta cena é muito comum em clínicas e hospitais oncológicos, todos já vimos ou até mesmo já vivemos cenas como esta.

Quando pensamos em termos psicossomáticos, entendemos que neste momento de espera, em sala aguardando um “veredicto”, existe com certeza um paciente.

Independente de diagnóstico ou terapêutica, estamos diante do paciente psicossomático onde a doença pode ou não existir concretamente (mas é real para o paciente), porém o quadro emocional já está sem dúvida caracterizado.

Diante da expectativa da consulta, já se concretizou um perfil psicossomático, esses pacientes estão vivendo sintomas tais como: insônia, distúrbios alimentares, ansiedade, tristeza, irritabilidade, angústia, depressão, medo, apatia, distúrbios gastrointestinais, dores locais, enxaquecas, stress etc. É inegável, o paciente está doente e sente-se desta forma. Além disso, um sentimento de vergonha (devido ao estigma) envolve a baixa auto-estima, assim percebemos que os olhares são evitados numa sala de espera, as pessoas buscam sentar-se nos locais mais distantes uns dos outros e em geral evitam conversas até para não se tocar no assunto. Às vezes, inquietas dirigem-se à secretária, perguntando sobre a demora, ou sobre quantas pessoas têm na sua frente; retornando ao seu lugar. Outras impacientes reclamam do atraso do horário e descarregam parte da ansiedade e irritação nas secretárias, sem que haja possibilidade de se alterar a espera.

O clima fica tenso e constrangedor, mas quem poderia esperar outra coisa diante dessa situação?

A espera é um dos momentos mais difíceis para o paciente, inclusive para seu acompanhante e familiares. É o momento de “suspensão” onde não há um caminho para dar vazão às emoções. Não há direção para se preparar, todas as possibilidades são viáveis e o paciente imagina tudo o que pode acontecer, mas não pode agir.

Depois de muito tempo de espera, às vezes horas, o encontro tão esperado e indesejável com o médico acontece e então a temida palavra câncer é pronunciada. O mundo do paciente desaba em questão de segundos! Morte? Dor? Perda dos cabelos? Perda do emprego? Como fica a família? Enfim, uma avalanche de imagens, medos e cenas desaba sobre a pessoa.

As reações da pós-consulta são as mais diversas. Há pessoas que se entristecem e tentam controlar o choro; existem aquelas que não conseguem controlar as lágrimas e deixam a tristeza transparecer; as que negam o diagnóstico, nem chegam a ouvi-lo e buscam um médico “mais competente”; há também os que deixam a raiva se aflorar, demostrando a frustração e a decepção por terem sido surpreendidos pelo inimigo.

Reações naturais de quem vive um momento decisivo em sua vida.

Após a consulta, com o veredicto, encontra-se a “porta de saída” das emoções: pode-se comemorar a vitória de um tratamento, de uma cirurgia, uma biópsia negativa; ou se iniciam os preparativos para uma cirurgia, quimioterapia, radioterapia; mas enfim a angústia cessa.

Agora se tem um caminho de alívio ou de vazão das emoções, mas a espera chegou ao fim!

Normalmente esses pacientes vivem essas emoções de forma solitária, sem apoio, fragilizados, tentando demonstrar força, naturalidade, disfarçando até para si próprios o momento que enfrentam, tanto na pré como na pós consulta.

O câncer, nesse momento, só é percebido nos exames, como um nódulo, ou um sintoma, muitas vezes não há dor física, mas sempre há uma enorme dor psíquica no nosso paciente psicossomático. E é essa dor psíquica que deve ser tratada nesse momento.

http://www.silviaivancko.com.br/service2.aspx

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